Por que tanta pressa? Exclusão à distância? por Pedro Modugno (*)

Ocorre com a pandemia do Covid-19 um fenômeno mundial de fechamento das instituições de ensino. Muitas organizações internacionais de fomento à educação orientam que a aprendizagem não pode parar e que as instituições de ensino devem buscar alternativas para que isso ocorra. A continuidade do ensino deve se dar através da continuidade de entrega de conteúdo.  Ora, ensino é mera entrega de conteúdo? As salas de aula e seus professores podem facilmente serem substituídos por máquinas, apps, e ferramentas digitais?

Certas medidas desconsideram que parte dos estudantes e trabalhadores da educação, professores e técnicos administrativos, não possuem acesso garantido e de qualidade aos aparatos tecnológicos necessários para participarem de aulas, conferências, grupos de trabalho por meio online.

Muito importante é analisar a maneiras que as pessoas vão acessar internet.  Celular não é computador, 4g não é banda larga, cômodo compartilhado com familiares e amigos em uma casa não é sala de aula.  Cama, sofá e mesa de jantar não substituem carteira de estudante.

Tal realidade (e gravidade do assunto) pode estar sendo mascarada pelo grande crescimento e aceitabilidade da modalidade EaD de ensino.  Hoje, o ensino EaD faz parte das universidades, públicas ou privadas. Na rede privada o EaD supera o ensino presencial. Na rede pública, está presente mesmo que em menor proporção em relação ao ensino presencial.  No estado do Rio de Janeiro, por exemplo, temos a Fundação Cecierj que através consórcio Cederj oferece cursos de universidades públicas do estado na modalidade EaD.  

Charge do cartunista Carlos Latuff, 2010


Contudo, ensino remoto não é ensino EaD. Geralmente, o ensino EaD tem uma “estrutura” planejada para poder acontecer. Além da estrutura tem a “escolha” do estudante que “preferiu” se matricular nessa modalidade por n motivos. Veja bem, o ensino EaD já é um tanto polêmico. Um dos pontos polêmicos é o fato do EaD ter contribuído demasiadamente para a mercantilização do ensino que tornou o diploma um papel comprado e não conquistado.

A educação cada vez mais vem sendo considerada um serviço. Porém, ela não é um produto para ser consumido. Educação é um direito! Só que para a elite econômica é importante que a educação seja mercantilizada e que dê lucros. Um exemplo disso é o investimento no acesso ao ensino superior através do Fies, ProUni, “bolsas de estudos”, e não em ampliação eficiente do número de vagas e instituições de ensino superior públicas.

Mais uma forma de mercantilização da educação é a compra e/ou uso de serviços de plataformas e aplicativos privados, como o Google Classroom ou o Zoom, por exemplo. Calma lá! As universidades com vastos cursos na área tecnológica não tem capacidade de desenvolver suas próprias plataformas e aplicativos para melhor atender as especificidades de cada curso?

Numa volta ás salas de aula por meio virtual, se coloca muito a opção de trancamento de curso, mas a questão é os alunos do ensino presencial não fizeram matrícula para um curso remoto e nem híbrido. Por que a pressa para aplicar conteúdo? Por que não fazer palestras, cursos de extensão, estímulos a novas pesquisas e produções coletivas e esperar o momento para que todos possam voltar juntos para a sala de aula, mesmo que essa acabe sendo virtual?

Não é ser contra a volta às aulas de forma remota, é ser contra a volta às aulas de maneira excludente e precarizada.  Não admitir uberização do ensino e não abrir portas para “passar a boiada” (1). Contudo, não podemos esquecer que temos alunos precisam se formar para melhorem suas condições de vida (comer e morar não é de graça!). Como encontrar um caminho em que não vamos estagnar e nem deixar ninguém para trás?

Ensino à distancia: um desafio para o meio acadêmico. Foto: Agencia Brasil, MCTIC

O inicio das aulas na UFRJ, por exemplo, está previsto para acontecer em breve, ainda este ano, contudo, as atividades presenciais, provavelmente, só voltarão em 2021, na esperança de uma vacina ou medicamento para conter a crise pandêmica. Apesar das autoridades universitárias dizerem que o assunto está amplamente debatido e discutido, a comunidade acadêmica ainda se sente perdida e preocupada


(*) Bacharel em Ciência Humanas (UFJF) e bacharelando em Serviço Social (ESS – UFRJ). Extensionista e pesquisador no Laboratório de Estudos Marxista José Ricardo Tauile (IE – UFRJ). 

[2] Em referência ao Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles em reunião do dia 22 de abril de 2020.

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